domingo, 17 de agosto de 2008

A interpretação extensiva na nulidade da eleição de foro em contratos diversos e o devido processo frente à sentença liminar em causas repetitivas

A declaração de ofício de nulidade da cláusula de eleição de foro em contratos de adesão e a sentença liminar de mérito em processos repetitivos são mais duas inovações trazidas pelas recentes reformas. Encontram-se, assim, inspiradas pelos princípios da economia e da celeridade processual. Elas visam evitar a oitiva do réu, e o prolongamento do trâmite processual, em situações que tal seria desnecessário para a convicção do julgador, apto, desde já, a se manifestar de forma conclusiva sobre o tema.

O parágrafo único introduzido no artigo 112 do Código de Processo Civil - Lei 11.280, de 16 de fevereiro de 2006 - autoriza ao julgador declarar de ofício a nulidade de cláusula de eleição de foro imposta em contrato de adesão. Assim declinando de competência para o juízo do domicílio do réu. A previsão visa resguardar o contratante vulnerável nas hipóteses em que se permite ajuste para modificação de competência (art. 111, CPC). Destarte, cria-se exceção à regra prevista no caput, pela qual, só por meio de exceção, poder-se-ia argüir a incompetência relativa (Súm. 33, STJ). Apesar de a declinação de ofício aqui tratada ser cabível em qualquer contrato de adesão, conforme interpretação dada pelo Superior Tribunal de Justiça, deve-se aplicá-la apenas quando se constate a abusividade do ajuste face ao contratante vulnerável (THEODORO Jr., 2007).

Aplicar interpretação extensiva a esse dispositivo para possibilitar a declinação de ofício em contratos que não sejam de adesão, embora manifesta a nulidade da cláusula de eleição de foro, é inadequado. A interpretação extensiva visa ampliar o sentido da lei quando se entende que o legislador disse menos do que pretendia (TARTUCE, 2006). Não é o caso. Nessa modalidade contratual é comum que o aderente não leia ou não entenda o que está assumindo, podendo ser prejudicado pela má-fé do ofertante. Nas demais espécies, no entanto, a dificuldade é mitigada (LOPES, 2008). De tal modo, não se tratando de hipótese adstrita aos limites desse parágrafo único, cai-se na regra geral. Atentar-se-á, então, aos artigos 112, caput, 113 e 114 do CPC.

A sentença liminar no julgamento de processos repetitivos foi a novidade trazida pela lei 11.277, de 7 de fevereiro de 2006. O artigo 285-A do CPC dispensa a citação permitindo a imediata prolação de sentença, julgando o mérito. Desde que se trate de matéria unicamente de direito e haja sentenças de total improcedência no juízo proferidas em casos idênticos.

Proferida a decisão, o autor poderá apelar, facultado ao juiz retratar-se, prosseguindo a ação com a citação (§1°, art. 285-A, CPC). Mantida a decisão, após a apelação, entretanto, o réu também será citado. Porém, para responder ao recurso (§2°, art. 285-A, CPC). Subindo ao Tribunal, esse se manifestará sobre o mérito, apreciado em primeira instância. Mas, caso entenda não se enquadrar na hipótese prevista no dispositivo em comento, poderá anular a sentença, determinando o retorno.

Em tal hipótese, o devido processo jurídico está preservado. Ambas as partes dispõem das condições necessárias para exercer o contraditório. O autor terá seu pedido apreciado na sentença liminar, e poderá apelar tanto para obter a retratação ou a revisão em segundo grau. Já o réu encontrar-se-á em situação vantajosa com a sentença antecipada (GARCIA, 2006). De qualquer forma, será chamado a se manifestar no momento oportuno. Não há ofensa à segurança jurídica.

Assim, quer-se evitar o trâmite inútil sem ofender o devido processo jurídico. Os efeitos na prática só poderão ser averiguados a médio e longo prazo. Aí reside o maior senão dessas reformas, usar a própria sociedade como laboratório de experimentação.

Referências
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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11280.htm> Acesso em: 9 agosto 2008.
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