terça-feira, 22 de abril de 2008

Ameaça estrangeira

No século passado, as noites de fim-de-semana em Paraibuna tinham muita curtição e azaração, além de uma galerinha que adorava uma boa confusão.

Uma molecada xiita se divertia em dar motivos para os estranhos apanharem. Era típico: identificavam um cara de fora sozinho, ou em pequeno grupo, que não aparentasse lá muita força, e o provocavam. Se o rapaz ousasse perguntar o que estava acontecendo, vinham os dez ou vinte mais corajosos e destemidos garotos do pedaço para descer o cacete na ameaça estrangeira.

Conheci um rapaz de outra cidade, de descendência oriental, que freqüentava Paraibuna nessa época. Ele conta que, uma vez, uma paraibunense o paquerava com o olhar, e ele correspondia. Bastou. Um dos briguentos veio intimidá-lo:

- Aí, japonês, você é de fora. Fique esperto!

Meu amigo é baixinho. O valentão, na frente dele, virava um gigante. Mas o japonês retrucou, referindo-se ao interlocutor:

-Por quê? Quem é daqui pode ser bobo assim mesmo?

Naquela época, ele perdia os dentes, mas não perdia a piada.

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Esperando Corpo-Seco

Trata-se de um documentário sobre o corpo-seco, um personagem popular da tricentenária e matuta cidade de Paraibuna. Ele, historicamente, foi um cidadão, identificado, com família ainda viva, que morreu há mais de um século. Como era muito mau, a terra o expelia no cemitério; o céu e, até mesmo, o inferno o rejeitam, impossibilitando o descanso eterno. Por esta razão, o padre teve que retirá-lo da cidade, levando-o, numa procissão, a uma região de mata distante; hoje, conhecida como o Morro do Corpo-Seco. Lá, murcho como que se tivesse secado toda a água do corpo, ele fica isolado, sendo respeitado e assombrando os incautos que resolvem incomodá-lo.

O documentário será apresentado por um paraibunense carismático, com trejeitos caipiras. Ele entrevistará os idosos e jovens que viram a assombração, ou acreditam na sua existência. Na edição, esses relatos serão dispostos em seqüência de forma a introduzir o Morro do Corpo-Seco, o corpo-seco e sua história e expor os causos mais fantásticos, dando uma lógica narrativa, como peças de um quebra-cabeça se encaixando. Por último, já com todas as histórias na cabeça, o protagonista passará uma noite sozinho no morro, com uma fogueira, preparando um café, e proseando com a câmera, posta em um tripé. Na edição, intercalando a vigília com os depoimentos, criar-se-á um clima de suspense, enriquecido pelos “imprevistos previsíveis”, como barulhos, sustos e declarações interessantes do apresentador, ao estilo “reality show”. O bacana é que as entrevistas entrecortando a espera do protagonista, a linha narrativa principal, ainda podem soar como se fossem “flashbacks”, compondo o clima pretendido.

Paralelamente, toda essa produção deverá ser filmada, como um “making-off”; exceto a vigília, para não a desaclimatar. Essa filmagem de reserva é importante já que alguma eventualidade, como perda das imagens da guarda ou o medo do protagonista interrompendo a mesma, pode prejudicar a idéia inicial. Também há, claro, a possibilidade de o próprio corpo-seco, importunado, não permitir o término das gravações. Nessas hipóteses, o “making-off” seria o documentário, intercalado pelos relatos.

O objetivo do filme é registrar, com respeito, a riqueza desse material existente em Paraibuna, que consiste na variedade de lendas e credulidade nas mesmas. Além disso, o acompanhamento da vigília no estilo “reality show”, gerando ou não situações inusitadas, tornar-se-á a peculiaridade da obra.

(Projeto de curta-metragem inscrito no Concurso de Histórias do Revelando os Brasis Ano III)

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Os elementos modificadores da cultura

Ainda não concluí nada, mas andei pensando na interferência que a cultura sofre.

Desde algum tempo, principalmente, a norte-americana (por enquanto a dominante), modifica a nossa música, as nossas roupas, os nossos filmes, a nossa literatura e tudo o mais. Outro exemplo, é a interferência da mídia, que faz com que o carnaval e a música nordestina cheguem por estas bandas reduzidas a "Axé", mero produto, descaracterizado. Assim, num primeiro momento, um elemento modificador da cultura é visto como prejudicial.

Porém, o interessante é observar que este elemento modificador, daqui a 100 ou 200 anos, torna-se um elemento agregador. Enquanto hoje modifica a cultura, no futuro, talvez seja visto como uma evolução desta. Aí, imagino a igreja católica aportando aqui nos primeiros séculos, modificando a cultura indígena de então, os negros africanos trazendo novos elementos. Quando chegaram aqui, descaracterizaram os costumes locais, mas, hoje, fazem parte desta cultura.

O maior problema disso tudo, e em razão da globalização, talvez seja a homogeneização, já que fica cada vez mais difícil a existência de grupos isolados que sigam uma evolução própria, com poucas interferências.

Mas a questão que fica é como lidar com essas interferências? Qual o limite? Ainda quero debater isso.

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