É isso mesmo, Bolsonaro vai
destruir o serviço público e as respectivas carreiras. É sua promessa de
campanha. E eu acredito nele. Por isso, como servidor público, voto contra ele. A neutralidade, neste
momento, com o candidato do PSL na frente, não existe, é ser conivente com sua
vitória e propostas, é suicídio coletivo.
N
o seu enxuto plano de governo[i] (seis mil palavras contra
30 mil do do Haddad) ele não menciona servidor público ou serviço público
nenhuma vez. Nenhuma! Quando trata
de Estado, é para falar de “enxugamento”.
Assim, um histórico de evolução
do serviço público nas últimas décadas, ainda insuficiente, claro, será jogado
no lixo. Bolsonaro quer fazer o Brasil semelhante ao que “
era há 40, 50 anos” (Folha, 15/10/2018)
[ii].
Vale recapitular, sem ir muito
longe. Em 1995, a União gastava com pessoal R$ 37.985 milhões. Em 2002, eram R$
75.029 milhões. Cresceu 34% acima da inflação do período. Em 2016, último ano
do governo Dilma, as despesas com pessoal foram de R$ 265.880,3 milhões. Aumento
real de 120%, acima da inflação
[iii].
A partir de agora, despesas de
pessoal (reajuste, aumento, valorização) não podem mais acontecer. Será o sucateamento geral do serviço Público
nas esferas federais, estaduais, municipais e distrital, afetando,
principalmente a população mais carente. E reclamar, fazer greve e
manifestações, poderá dar cadeia num eventual governo do candidato do PSL.
CORTE DE DESPESAS
Com a aprovação da
Emenda Constitucional 95, o crescimento
das despesas públicas está limitado à inflação pelos próximos 20 anos. Dessa
forma, não há como se pensar em reajuste ou aumento de salários num orçamento
engessado e que terá que achar espaço para acompanhar as demandas crescentes da
sociedade. “De fato reduz os gastos sociais em porcentagem per capita (por
pessoa) e em relação ao PIB, à medida que a população cresce e a economia se
recupera, como é comum nos ciclos econômicos” (Outras Palavras, 19/7/2018)
[iv].
Ela tem possibilidade de revisão em 10 anos, mas restrita ao índice de correção
[v].
Paulo Guedes, o superministro do candidato
do PSL, já prometeu manter a equipe econômica do Temer (Estadão, 13/7/2018)
[vi],
a mesma responsável pela emenda constitucional 95. Bolsonaro
votou a favor da emenda (Catraca Livre,
11/10/2016)
[vii]
e não propõe mexer com ela, como Haddad deixa claro em seu programa (p. 5)
[viii].
DEMISSÕES EM MASSA
Logo, o Estado, num eventual
governo Bolsonaro, para atender as necessidades crescentes da sociedade, vai precisar
fazer “cortes na carne” diante do orçamento público em estrangulamento progressivo,
mesmo que o PIB cresça. E estes cortes serão
“na carne” do servidor público. Primeiro, com suspensão de novas
contratações (com todas as consequências que a sobrecarga trará ao servidor da
ativa). Depois, com achatamento das remunerações. Por fim, com demissões. O
candidato a vice, General Mourão, é defensor do fim da estabilidade do servidor
público (RBA, 27/9/2018)
[ix].
Nesse sentido, é importante lembrar que Bolsonaro votou a favor da
terceirização irrestrita (Carta Capital, 22/3/2017)
[x]
e diversos especialistas alertam que ela atingirá o serviço público.
-"Num cenário de redução dos
gastos públicos, por conta dos limites orçamentários da Emenda Constitucional
(EC) 95, a gente avalia que os estados vão usar esse instrumento de poder
ampliar a terceirização do serviço público para reduzir os seus custos. Como as
condições dadas aos trabalhadores pioram, influencia no atendimento
também", explica Adriana Marcolino, socióloga e técnica do Dieese. (RBA,
4/9/2018)
[xi]
E o capitão não perde a
oportunidade de mostrar sua total falta de apreço ao servidor público. É um histérico
defensor do estado mínimo (Globo)
[xii]
, sem se dar conta que
Brasil tem menos
servidores públicos que países desenvolvidos. Em comparativo com o
percentual da população, eles chegam a ter o dobro (Correio Braziliense,
30/10/2016)
[xiii].
Um número suficiente de servidores significa melhor qualidade do atendimento
das necessidades da população, na saúde, educação, segurança. É o que todos tem
direito. Afinal, é para isso que pagam impostos.
CRISE NA EDUCAÇÃO
Bolsonaro propõe, por exemplo, ensino
à distância a partir dos seis anos de idade, o que pode resultar, por
consequência, em demissão em massa de professores. “Salutar” diante da EC 95, a
medida pode trazer consequências danosas
para o futuro do país e para a família, principalmente a mulher, que acaba
tendo que ficar em casa para acompanhar o filho.
- “Perguntado sobre em qual etapa
da educação pretendia investir no ensino à distância, respondeu:
— No fundamental, médio, até
universitário. Todos podem ser à distância, depende da disciplina. Fisicamente
em época de prova ou aula prática — afirmou o presidenciável. (O Globo,
7/8/2018)
[xiv]”
CRISE NA SAÚDE
Na área da saúde, o
presidenciável entende que já gastamos
de forma excessiva com o SUS, evidenciando intenções de corte de
investimentos. O que vai na contramão das conclusões de especialistas do setor,
como Mário Scheffer, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo (USP):
- “O percentual de recursos
públicos destinados ao SUS é infinitamente menor do que o de outros países que
também possuem sistemas universais de saúde. A insuficiência de recursos é um
fato”, argumenta Scheffer.(Brasil de Fato, 14/9/2018)
[xv]”
CRISE NA SEGURANÇA
Mesmo na segurança pública, onde
Bolsonaro é visto de forma mítica como “a solução definitiva”, suas propostas
consistirão no aumento do número de
morte
de policiais. Para Daniel Cerqueira, doutor em economia e conselheiro do
Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a política para a área do candidato
seria uma tragédia para o país. Principalmente, vale questionar
como uma população armada melhorará o
trabalho do policial. O pesquisador afirma (El País, 23/10/2018)
[xvi]:
- “Quanto mais armas legais, mais
armas irrigarão o mercado ilegal, seja por furtos, roubos ou extravios.
Consequentemente, o aumento da oferta de armas no mercado ilegal, faz com que o
preço da arma diminua, facilitando o acesso à mesma pelo criminoso mais
desorganizado, exatamente aquele que vai assaltar nas ruas e termina cometendo
o latrocínio. Na CPI das armas de fogo no Rio de Janeiro, se constatou que em
10 anos apenas das empresas de segurança privada, quase 18 mil armas foram
extraviadas ou roubadas.”
CRISE NA JUSTIÇA
O capitão já demonstrou também
total falta de respeito à autonomia do judiciário. Quando seu filho, deputado
federal mais votado na história, ameaçou
prender
ministro do STF se este contrariar o papai (El País, 21/10/2018)
[xvii],
ele fez troça: “Já adverti o garoto” (Folha, 22/10/2018)
[xviii].
Mas o patriarca mesmo já havia afirmado em
junho: “Governar com um Supremo desse que tá aí fica complicado.” Ele defende a
ampliação da composição da Corte de 11 para 21 magistrados, “para termos a
maioria lá dentro.” (Blog do Josias, 22/10/2018)
[xix].
Foi o que Chavez fez para dominar a Venezuela. Aumentou de 20 para
32 juízes na Suprema Corte, nomeando 12 (RBA, 27/9/2018)
[xx].
Bolsonaro já teria dito: “Chávez é uma esperança para a América Latina e gostaria
muito que essa filosofia chegasse ao Brasil” (Veja, 12/12/2017)
[xxi].
Embora Bolsonaro tenha perdido o apreço pelo líder venezuelano, fica a
revelação do “apreço” que ele tem à democracia. Para a historiadora Maria
Hermínia Tavares, “Acusaram o PT de imitar a Venezuela, mas é Bolsonaro quem se
espelha no processo de lá” (El País, 9/10/2018)
[xxii].
Conrado Hubner Mendes, doutor em direito e
professor da USP, faz uma análise contundente no artigo intitulado “PIB X PIbb:
rumo à Venezuela, pela direita”, em que afirma que “a plataforma política de
Bolsonaro ignora absolutamente a
conexão entre crescimento econômico de um lado e a qualidade do estado de
direito de outro” (Época, 15/10/2018)[xxiii].
Ele também já declarou sua
intenção de controlar o Ministério Público ao revelar que
não pretende respeitar a lista tríplice para nomeação do chefe da
instituição, caso os indicados não estejam alinhados a ele (G1, 16/10/2018)
[xxiv].
ORÇAMENTO BASE ZERO
Um risco maior que a EC95 pode
estar no programa do Bolsonaro. Com sua ideia não muito clara de orçamento base zero, o capitão diz em
seu programa que “o montante gasto no
passado não justificará os recursos demandados no presente ou no futuro.” E
explica que “cada gestor, diante de suas
metas, terá que justificar suas demandas por recursos públicos”. É um risco
enorme para o administrador, para as instituições públicas. O orçamento do ano
seguinte sequer tem garantia de ser igual ao do ano passado. É pior que a EC95.
Vamos pagar pra ver?
GREVE É CRIME
E como fazer greve ou brigar por
reajuste nas próximas duas décadas diante da emenda constitucional 95? Nossos
problemas não poderão ser resolvidos com pressão e negociações com Executivo.
Uma emenda só pode ser alterada por 3/5 dos deputados e senadores em dois
turnos de votação. Nos próximos quatro, oito, sei lá quantos anos, quem vai pra
rua por melhores condições de trabalho com um governo composto por um
“montão de militares”, nas palavras de
Bolsonaro?
[xxv].
Um projeto de lei apresentado por Bolsonaro, aprovado na
Comissão de Constituição e Justiça, criminaliza manifestações de greve e pune
com até
quatro anos de cadeia. Ele
tipifica especificamente obstrução de vias públicas sem autorização, incluindo
“aglomeração de pessoas em manifestações de qualquer natureza” (Gazeta Online,
29/5/2018)
[xxvi].
E, lembre-se, bandido bom é bandido morto.
HADDAD
Os governos petistas são conhecidos por outro
tipo de relação com o servidor público. Embora, claro, seja justo não estarmos
satisfeitos, nunca fomos afrontados com riscos à vida, à demissão em massa ou
cadeia para quem reclamar. Haddad é reconhecido, por exemplo, pela criação do piso
nacional dos professores.
O candidato do PT, agora, em seu plano de
governo, com impactos diretos para o servidor público, promete ações para revogar a emenda constitucional 95 e a terceirização
irrestrita.
Também afirma quanto ao seu governo:
- “Vai investir na
profissionalização e valorização do serviço público. Propõe-se uma política de
recursos humanos para o setor público que leve em consideração, de modo
articulado e orgânico, as etapas de seleção, capacitação, alocação,
remuneração, progressão e aposentadoria. É crucial associar a gestão das
atividades profissionais e funções no setor público à ampliação da capacidade
de prestar serviços de forma cada vez mais simples, ágil e efetiva. É preciso
qualificar os concursos e conter a privatização e a precarização no serviço
público, expressas pela terceirização irrestrita e pela disseminação de modelos
de gestão e agências capturados e controlados pelo mercado.”
Sobre o tamanho do Estado diz:
- “Deve ter o tamanho necessário
para promover a justa regulação da economia e da sociedade e para a prestação
de serviços públicos eficientes e de qualidade para o povo, de modo a alterar
estruturas burocráticas que, embora aparentemente neutras, atuam no sentido
de preservar e reforçar as profundas
desigualdades sociais.”
CONCLUSÃO
Ao tempo que essas medidas forem
sendo tomadas contra o servidor público federal, é claro que vão se espalhar para as demais esferas,
a estadual, a municipal e a distrital, na medida em que a União tiver “sucesso”
no corte de gastos.
O principal sentimento numa
eleição deve ser de empatia. O principal questionamento deve ser como melhorar
a vida de todos. Assim, um professor, um profissional da saúde, um policial, um
técnico ou analista do judiciário, não pode dar um cheque em branco para um
candidato que promete piorar a sua vida
e de toda a sociedade. Apesar de toda ojeriza que se pode ter em relação ao PT,
seus governos já mostraram um mínimo de dignidade com o trabalhador. Assim, agora
é Haddad. Não votar contra Bolsonaro é suicídio coletivo.
- “Diante do pior risco iminente,
de ações que, como diz Hannah Arendt, 'destroem sempre que surgem',
'banalizando o mal', propugnadas pela campanha do candidato Bolsonaro, darei um
voto crítico e farei oposição democrática a uma pessoa que, 'pelo menos' e
ainda bem, não prega a extinção dos direitos dos índios, a discriminação das
minorias, a repressão aos movimentos, o aviltamento ainda maior das mulheres,
negros e pobres, o fim da base legal e das estruturas da proteção ambiental,
que é o professor Fernando Haddad. (Marina Silva)
[xxvii]”